Seja bem-vindo. Hoje é

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Praia

Praia

Peixes, cardumes,
Ondas, queixumes,
Verão.
Belas morenas
Tardes serenas
Paixão.

Mares profundos,
Olhos bem fundos,
Tristeza.
Pernas divinas,
Lindas meninas,
Beleza.

Beijos, lamentos
Soltos aos ventos
Apenas.
Sangue nas veias
Brancas areias
Amenas.


Santos, outubro 1949 (14 anos).
Ives Gandra

OUTRO CROMO

OUTRO CROMO

No horizonte o sol desmaia,
Sem o brilho que antes tinha.
Somente fica uma linha,
Reluzente como a alfaia.

A areia branca da praia,
Está branquinha, branquinha,
Que até parece ser minha,
A areia branca da praia.

A noite negra se ensaia
No mais tenebroso efeito,
Bem distante, na garrida.

Ao ver a areia da praia,
Que dorme, branca, em seu leito,
Eu lembro de ti, querida.

São Paulo, Agosto de 1951.
Ives Gandra

COMPASSO DERRADEIRO

COMPASSO DERRADEIRO

No compasso do tempo gero teias,
Que se emaranham em torno de meu mundo,
Neste relógio feito por areias,
Endereçadas para um chão sem fundo.

Dentre a cimeira parte pouco resta,
Quase tudo passado da medida.
A vida não foi luto, nem foi festa,
Como não foi também toda perdida.

A derradeira areia está bem perto
E meu último passo bem à vista.
O canto continua no deserto,
Sem saber de seu fim quant’inda dista.

Neste tempo renovo um só compasso,
Que formatou, na luta, meu espaço.


Jaguariúna, 01/05/2009.
Ives Gandra

A Primavera eterna

A Primavera eterna

A pátena do tempo é mais intensa,
Cobrindo o temporal e o intemporal,
Com um toque que o sonho não dispensa,
Como o mar que na praia põe o sal.

Não há no nosso amor porém as rugas,
Nem corre em nossas veias o cansaço,
Como em Bach os prelúdios geram fugas,
Sorvemos este bem em todo o espaço.

Desde cedo dedico-te, meu verso,
com a mesma imensidade, todos anos,
Tu és, posso dizer-te, um Universo,
Onde imperas com ares soberanos.


Amor de meu amor, amor eterno,
Que sempre em primavera torna o inverno.


Rio, 08/04/2008.
Ives Gandra
i

CICATRIZES DO TEMPO

CICATRIZES DO TEMPO

Cicatrizes do tempo formam rugas,
Desfigurando seres pela vida.
Por mais que se vislumbrem novas fugas,
Haverá sempre o dia da partida.

As almas, muitas vezes, ficam nuas,
Descortinando assim tais cicatrizes,
Contorcidas nos troncos e nas ruas
Dos abismos sem fim e sem matrizes.

Não se limpam da pele as rudes marcas,
Mas podem se limpar tatuagens d’alma,
Tornando as tristes nódoas, nódoas parcas,
Na busca da verdade, eterna e calma.

Quem luta, na existência, por ser forte,
Liberdade terá na sua morte.

Jaguariúna, 20/11/08.
Ives Gandra

A nave da vida

A nave da vida

A vida é frágil nave que caminha
Por águas procelosas, águas calmas,
E que as singra, sem rumo, mas sozinha,
Sem saber o que faz, à bordo, as almas..

O seu percurso, até final naufrágio,
Não deixa marca alguma em superfície,
Num canto marginal e sem adágio,
Que a todos diz aquilo que não disse.

Navega, mesmo quando iluminada,
Buscando seu momento derradeiro,
Navega, pelo tempo, para o nada
Entre os homens sem ter um timoneiro.

Fecha-se sempre atrás da nave o mar.
Só nela há de salvar de Deus o amar.

Ives Gandra

Orfeu

Orfeu

Tange, Orfeu, sozinho, tange a lira agreste
Para afugentar a dor, que te devora,
Na floresta calma, embaixo de um cipreste,
Dorme para sempre Eurídice e singela,
Como se dormisse em teus braços outrora.
Tange, Orfeu, a lira, tange e lembra dela.

Ao tangir pungente, entoa um triste canto,
Ó poeta amante, sem o amor da amada,
Canta, Orfeu, sozinho, canta que teu pranto
Enche a selva toda de melancolia,
Canta, Orfeu, e lembra da formosa fada,
Que morreu por ti e muito te queria.

Olha os animais, Orfeu, que o teu penar
Recobriu de dor, de dor por tuas mágoas,
Tanto sofrimento fez que novo mar
Filho seu nascesse, em lágrimas brotado
Pelo transformar dos corações, em fráguas,
Dos nobres amigos, olha todo o lado.

Tanto amor tiveste, Orfeu, e tão ardente,
Que perdeste Eurídice, por tanto amor,
Tu, que até Plutão, supremo e indiferente,
Recobriste em pranto, faze ao que te resta
Dos amigos nobres, que choram de dor,
A felicidade, canta na floresta.

Nunca mais mulher alguma, grande Orfeu,
Teu amor terá ou tua inspiração,
A paixão da morta é grande e não morreu,
Como não morreu a dor, que te entristece,
Canta, Orfeu, o canto que no coração
É mais lindo e puro que uma santa prece.

Tange, Orfeu, sozinho, tange a lira agreste
Para afugentar a dor, que te devora,
Na floresta antiga, embaixo de um cipreste,
Dorme para sempre a amada e tão singela,
Como se dormisse ao lado teu outrora,
Tange, Orfeu, a lira ... tange e lembra dela.


Ives Gandra

Última semente

Última semente

Eu a tive por última semente,
No silêncio do fim, que desencanta.
Como renasce a vida, fragilmente,
A terra renascera, em muita planta.

A pálida semente, porém, fria,
Eu conheci, na terra, mal lançada,
Simbolismo patético do dia,
Perto da noite e não da madrugada.

Eu conheci, no solo, ressequida,
Tão morta, logo após o seu carinho,
Como a vida ressurge, parte a vida
E a terra tem, calada, igual caminho.

Eu a tive por última semente,
Sem forças, trespassado, mudamente.

Ives Gandra

Teu silêncio

Teu silêncio

O Teu silêncio busco desvendar,
Nas névoas de uma estrada, que não trilho,
Sendo aquele que tem cansado o olhar
E que luta por ser chamado filho.

O Teu silêncio é forte e muito fraca
A força que projeto na procura,
Alicerce desfeito sem estaca,
Luz apagada em plena noite escura.

O Teu silêncio vive em minha vida,
Cujo curso reduz o seu caminho,
Mas ando sempre e sinto esta ferida
Que a rosa nunca fa7, mas faz o espinho.

O Teu silêncio eu sei, porém, um dia.
Será descortinado e a minha via.


Ives Gandra

Soneto sobre a lenda dos sargaços

 Soneto sobre a lenda dos sargaços

“E, no olhar de sargaços, fui espelho.
Sargaços deram cor a teu olhar,
Que o sangue quando corre pelo mar
É verde amarelado e não vermelho.

Por que não despertei sem te acordar?
Estrelas despencaram do céu velho
Refletindo nas águas que eu espelho
A distância jasmim de teu olhar.

Por que foi que perdi-me no interlúdio?
Ultrapassei o encanto de teus braços
Sem nunca receber qualquer repúdio

Não foi, por certo, a névoa nos espaços?
Mas se foi, por que causa meu prelúdio
Teus olhos coloriu cor de sargaços?...”


Ives Gandra

Soneto de vida interior

Soneto de vida interior

Senhor, põe-me, outra vez, à Tua frente
E faze-me encontrar o Teu caminho.
Perdido fui e sou, se de repente
Somente a mim me entregas e sozinho.

Quantas vezes me sinto diferente
E volto a ser, no tempo, descaminho!
Quantas vezes Te fito e sou descrente
E, no espaço, me faço agreste espinho!

Senhor, mostra-me sempre o Teu amor,
Qual tesouro enterrado num terreno,
Valendo mais que todos, pois que é vida.

E faze-me Teu filho no que for
A vivência daquele tom sereno,
Que me leva à chegada da partida.

Ives Gandra

Querer-te

Querer-te

Não consigo este vício abandonar
Que me faz, pelo tempo, sempre igual,
Como igual corre a noite sobre o mar
E deixa o mar na praia seu sinal.

O vício me ensinou a naufragar,
Num naufrágio romântico e informal,
Que não traz o sossego por seu par
E não chega, no todo, a ser um mal.

É, contudo, perpétuo como o sal,
Silente como o puro comungar
E triste como o amor sem ter aval.

É o vício de querer-te, devagar,
De mansinho, de fato e de enxoval,
De minha prole mãe, em santo altar.

Ives Gandra

Pelo caminho de teus olhos


Pelo caminho de teus olhos

O recesso intocável de tua alma
Invadi, repentina e mudamente,
Através de momento, cuja palma
Cruzou pelos teus olhos, diferente.

A profundez longínqua foi semente
Do sucesso, que trouxe após a calma,
E a conquista desfeita, docemente,
Conquistou o senhor, que hoje te ensalma

Do assalto não mais resta que o caminho,
Onde, silente, entrei, despercebido,
Cuidando retirar—me, por inteiro.

Perdi-me, todavia, e não sozinho
Retornei, muito estranho e sem sentido,
De teu recesso eterno prisioneiro.


Ives Gandra

Orfeu

Orfeu

Nenhuma estrela havia, em seu olhar.
Um silêncio noturno mal rondava
O muro esmuguecido do pomar,
Cujo fruto sua alma alimentava.

À noite era, porém, linda e presente,
Coberta a lua por escura fronha,
Era a noite do tempo inexistente,
A noite, que consola o mal, que sonha.

Mesmo assim cobrava-se de morte.
Um olhar negro é duplo e, se empoçado
Em funda sensação, encerra a sorte
De um outro olhar no olhar cio próprio fado.

Nenhuma estrela havia. Havia Orfeu,
Lembrando-se da amada que morreu.


Ives Gandra

Olhar de infância

Olhar de infância

Penetrei pela enorme profundeza
Deste mar colorido de teus olhos
Triste azul. Melancólica tristeza.
Penedo transformado sem escolhos.

Penetrei. Nadador por ter andado.
Suicida solitário. O mar azul
Logo cobriu-me num estranho fado
Quem em vez do Norte, descobriu o Sul.

Azul dentro do azul. A maresia
Marítimos escombros desvendava
E os sonhos que eu fazia, desfazia,
Desfazendo um abismo à idéia escrava.

Afoguei-me no fundo da distância
De um olhar, que busquei por minha infância.

Ives Gandra

O temporal do tempo

O temporal do tempo

O temporal do tempo temperado,
Descortinando sonho e maresia,
Faz-se espaço do espaço despassado,
Que a tela do horizonte mal desfia.

O olhar, que não penetro, desafia
Meu soneto de amor descompassado.
Certeza tão incerta cada dia,
No mundo que descubro de meu lado.

Não sei do que saber e para que,
Nem sei se você sabe o que já sei
Eu sei o que se sabe e o que se

Pelo caminho simples de tal lei.
E não me importa, pois quero você,
Vocação de palhaço e não de rei.

Ives Gandra

O soneto mais estramho

O soneto mais estramho

Silêncio o soneto mais estranho.
Nem meu. Nem de ninguém. Por quê? Não sei
O olhar foi talvez verde ou foi castanho,
Bem antes do silêncio em que parei.

Há remos esperando por seu rei
E banhistas que buscam no seu banho
Equacionar o tempo com a lei.
O silêncio do espaço, que eu arranho.

Onde arranho, onde luto e silencio,
Vive o soneto mais estranho assim.
O sol onde ele nasce é sol de estio,

Que não conhece o aroma do jardin.
E desta história lá eu perco o fio,
Pois lá começa a história de meu fim.


Ives Gandra

O sentido da vida

O sentido da vida

O sentido da vida, por inteiro,
Só desvendo no seu sonho de vida
Que transforma a semente no celeiro,
Alimento da terra mal ferida.

A santidade é o toque derradeiro
Descortinando o ponto de partida,
Cujo encontro se faz, quando o sendeiro,
Na chegada descobre o fim da lida.

Quão difícil, porém, se sou quem trilho
Esta estrada de Deus feita p’ra mim,
Pois qu’outras menos belas já trilhei.

Quão difícil! Contudo, sou Seu filho,
E tê-la quero dentro do jardim,
Onde O encontro, paterno, como Rei.

Ives Gandra

O naufrágio

O naufrágio

O naufrágio roubou-me o barco triste,
Silentemente, como rouba a vida.
O meu naufrágio é um mal, que mal existe,
Pois que, no fim, começa outra partida.

Anteriormente vira esta ferida,
Ferida, meu amor, que nunca viste.
Continuei capitão, que inda resiste,
Porém, sem ter sentido tal descida.

O naufrágio, portanto, foi normal.
O barco triste soçobrou por frágil,
Nas águas calmas, desfazendo em sal.

Depois, o mar voltou a ser caminho
De um outro menos triste e bem mais ágil
E o barco triste o mar deixou sozinho.

Ives Gandrai

O encanto da presença

O encanto da presença


O soneto do amor, que não tem fim,
Eu refaço, silente, uma vez mais.
Há cores florestais no meu jardim,
No meu jardim... sem cores florestais.

A imensidão das sombras noturnais
De novo ganham vida, atrás de mim,
Navio que navega junto ao cais
Ou corcel livre e preso no selim.

O soneto do amor, de um grande amor,
Que a própria vastidão não é tamanha,
Infinita a visão de sua crença.

Continue assim sendo o seu calor
E traga, dessa forma sempre estranha,
À minha vida o encanto da presença.



Ives Gandra

Espaço azul

Espaço azul

Teu derradeiro olhar foi desencanto.
Há muito que eu não sofro, calmamente,
O momento final tão sem espanto.
O meu hábito de última semente.

Quantas messes perdi na minha frente?
Não sei. Nem sei quem sabe este meu canto.
Corre o tempo num tempo diferente
E o fim sempre me resta em acalanto.


Teu derradeiro olhar, nem tu soubeste
Quão derradeiro foi! Fim de Istambul
E fim que leva o fim como um “Far West”.

Eu deixo, uma vez mais, o Norte e o Sul.
Minha roupagem, hoje, se reveste
De novo encanto, por espaço azul.


Ives Gandra

Esboço

Esboço

Feneceram as rosas pelo azul.
O verde naufragou em plena idéia
E perdeu o comando para o Sul.
Soçobraram lembranças de odisséias.

A bordo do naufrágio estava o mar.
Debalde. A sonda cinza não mais era.
Restava o simbolismo cor de ambar
De um Outono medido em primavera.

Mimosas... depois foram sobre o espaço
Colorações de seda em sombra rubra.
Da funda emanação ficava um passo,
Que o negro faz que o branco sempre cubra.

Eis o esboço de um simples quadro estranho,
Onde pascem meus versos sem rebanho.


Ives Gandra

É noite

É noite

É noite. À minha amada este soneto
Componho sem momentos de cansaço,
Quando o tempo dos versos faz-se escasso
Como bandas de música em coreto.

O costume da frase teve danos,
Igual folha varrida em tempestade.
Restou-me apenas, nua, esta verdade
Que me segue, silente, pelos anos.

Quero-te muito, mãe de meus seis filhos,
Mulher de meu amor, sem convenção.
Condu assim sempre o coração
Como um trem conduzido por seus trilhos...

É noite. À minha amada, em próprio punho,
Componho este soneto, sem rascunho.


Ives Gandra

Cromo

Cromo

Estilhaços do meu canto
Ferindo o pastor do espaço.
Granadas por acalanto,
Na palavra do teu passo.

O teu amor em mormaço.
O meu amor sem espanto.
No azul o silêncio caço,
Metralhando o desencanto.

Abatido cai no sal.
A paz retorna, no céu,
À calma do após a guerra.

Volta o tempo a ser igual
E o amor por sidéreo véu
É coberto sobre a terra.

Ives Gandra

Claras águas

Claras águas

Pelo silêncio de teus olhos mortos,
Vivos, no espaço, apenas, das idéias,
Surge uma ponte com aranha e teias,
Unindo as pedras dos caminhos tortos.

Trilhei a ponte. De madeira velha,
Encobre anseios, que correm debaixo,
E o escuro lí em que assim se espelha,
A forma tem de retilíneo facho.

Da margem sempre ríspidos escolhos
Tombam turvando a fonte já turvada,
As lágrimas, talvez, que de teus olhos
Vêm de uma estrada em busca d’outra estrada.

Dizer que, um dia, aquelas claras águas
Limparam de nós dois todas as mágoas..


Ives Gandra

Areia do deserto

Areia do deserto


Era vermelha a areia do deserto
E assim mesmo buscou-a a carne-lodo
O caminho, em seguida, fez-se incerto
E o horizonte sumiu-se então de todo.

Cobriram-se os espaços siderais,
Choveram tempestades de caprichos
E o frio dos sentires hibernais
Despertou do letargo internos bichos.

A vida-barro, pútrida, parada
Perdeu a luz primeira das idéias
Escondido o binômio tudo-nada,
Semente solitária de odisséias.

Carne-lodo, partida a causa-sangue,
Restou, desvirginada, mas exangue.


Ives Gandra

A busca do caminho

A busca do caminho


A confusão, Senhor, de mim afasta
Para que eu veja claro o que era escuro
E, qual papel inútil d’uma pasta,
Retira para unir-me ao meu futuro.

A pergunta que eu fiz já tem resposta.
Vale o encontro da própria vocação.
“Vem e segue-me” e segue-Te quem go
Da Verdade e da Luz, por dimensão.

A busca do caminho, quando existe,
É mansa, se ela é grande, se ela é forte,
E rica, quando pobre e nunca triste,
Fazendo eterna vida mesmo a morte.

Que eu seja, como fruto, uma semente
A gerar o Teu mundo diferente.

Ives Gandra

NAVEGAR

NAVEGAR

Eu navego entre mares e tormentas,
Sem marujos no barco que conduzo,
As ondas que no coração rebentas
De teus olhos desvendam tom difuso.

As cores coloridas e incolores
Desfraldam os painéis das caravelas,
E se algum dia destes lá tu fores
Colorirás com tintas minhas velas.

Navegar é preciso, eis a verdade.
Para mim fazer versos, eu preciso.
Nas folhas eu escrevo, sem vaidade,
Sem talento, sem voz, sempre indeciso.

Meu diário silente continua
E desvenda a verdade fria e nua.

SP., 14/03/2010.
Ives Gandra

MEU INTERIOR

MEU INTERIOR

Eu percorro as planícies de meus sonhos
Onde os rios deságuam as esperanças,
Pois nos corações formam-se, tristonhos,
Nas saudades dos tempos de crianças.

Meu íntimo procuro numa escada
Que desço sempre mais sem ver o fundo,
Nesta busca infinita cuja espada,
Eu brando para fora deste mundo.

Meu universo interno é bem mais denso,
Bem mais forte, mais largo, mais aberto
Que o universo conhecido, é mais intenso
E para mim fica sempre a descoberto.

Os versos que eu componho todo o dia,
Embora fracos, geram-me alegria.


SP., 13/03/2010.
Ives Gandra

NOSSO LEMA

NOSSO LEMA

A serenata à noite faz-se escassa,
O noturno descobre as alvoradas.
Minh’alma de novo se entrelaça
Subindo deste amor pelas escadas.

A minha terna amada bem desperta,
A chama do querer qu’invade o peito,
A hora não se faz mais hora certa,
Nem abre o coração a meu despeito.

Os olhos são os mesmos desde então,
De lembranças tomados por inteiro,
Renova-se, no velho coração,
A vocação de eterno timoneiro.

Meus versos por você têm um só tema
Do pleno amor que sempre foi meu lema.


SP., 07/03/2010.
Ives Gandra

domingo, 24 de outubro de 2010

CAVALEIRO

CAVALEIRO

Aquele cavaleiro das cruzadas
Cavalgando por sonhos aos milhares,
Brandindo seus escudos e as espadas
Na busca do Sepulcro com seus pares.

Aquele cavaleiro que, no Cristo,
Colocou em batalha seu encanto,
Na sarracena terra tendo visto
Tudo aquilo que causa sempre espanto.

Aquele cavaleiro e seu cavalo,
Galopando as areias do deserto,
Sem medo, sem descanso, sem abalo,
Na procura de seu caminho certo.

Aquele cavaleir’inda sou eu,
Vivendo um ideal que não morreu.

SP., 06/03/2010.
Ives Gandra

PENSAMENTO PEREGRINO

PENSAMENTO PEREGRINO

Da minha frota as naves estelares,
Os espaços descobrem do infinito
E deixam no Universo em seus altares
O imaginário próprio e o próprio mito.

Não saio do lugar, mas minhas naves
Percorrem as distâncias mais distantes.
Os meus versos do cosmos têm as chaves,
Como dos mares eles tinham dantes.

Os povos diferentes d’outros pólos
Ora recebem bem, ora com guerra
E as naves lá estão em vôos solos,
Com saudades de todos e da terra.

Comando, desta forma, os pensamentos,
Peregrino dos astros e dos ventos.

Santana de Parnaíba, 01/03/2010.

Ives Gandra

RETIRO

RETIRO

Meu retiro começo com meu Deus,
Na esperança de ter misericórdia.
Os avanços que faço são só Seus,
Meus fracassos, porém, geram discórdia.

Sua Mãe me faz sempre tão feliz,
Com’um infante lanço-me em seus braços.
Com Ela sinto aquilo que bem quis,
Ter uma vida feita em ternos laços.

Por todos que dependem faço preces,
Familiares, amigos, empregados.
E o coração que tenho e que conheces
Pede agora perdão de seus pecados.

Protege-me, meu Deus, neste retiro,
Pois tendo-Te do lado, hoje, me inspiro.


Santana de Parnaíba, 26/02/2010.
Ives Gandra

NUVENS

NUVENS

As nuvens pascem versos pelo espaço.
Mudam de tom e cor, todo o momento.
Os sentires do bardo, a cada passo,
Alteram também sempre o pensamento.

As ovelhas são nuvens coloridas
De cinza, branco e preto, todo o dia,
No rebanho celeste sem feridas
Em planeta pintado em cor azul.

Imagens sempre nascem com os versos,
Desfazem-se, porém, junto das nuvens,
Parecem mais gerar os tons diversos
Que se encontram nos pórticos de Rubens.

As nuvens pascem versos pelo espaço
Enquanto eu as contemplo, em tempo escasso.



SP. 25/02/2010.
Ives Gandra

PARA MULHER

PARA MULHER

A mulher, como eu vejo, desde infante,
Ao mundo oferta o encanto qu’ele tem,
No permanente sempre e num instante,
Quando faz a presença ser um bem.

O próprio Deus da Virgem precisou
Para nascer, salvando a humanidade.
A mulher, pelo tempo, faz o show
Da vida ter valor como não há-de.

E, nas leis, a mulher agora é parte,
No toque tão humano em seu agir.
De Camões conquistou, engenho e arte.
Na Justiça que faz sem denegrir.

Mulheres do Instituto o meu respeito
Por tudo que geraram no Direito.


SP.24/02/2010.
Ives Gandra

SEM JARDIM

SEM JARDIM

Navego pelo espaço de meus dedos
Timoneiro de um barco sem seus mastros.
Nele faço de há muito os meus enredos,
Caminhando por sobre o mar dos astros.

O pensamento galgo de um só salto
A imensidão cerúlea do universo
E se desfaz inteiro pelo asfalto
Que se encontra por dentro de meu verso.

Penetro na floresta dos sem nada,
Descobrindo mil feras no meu estro
E luto com meu arco sem espada
Num papel que se faz demais canhestro.

Num desencontro intenso eu resto assim,
Sem palavras, sem sonhos, sem jardim.


SP. 16/02/2010.
Ives Gandra

GIGANTE ADAMASTOR

GIGANTE ADAMASTOR

Todo o escritor na busca de seu tema,
Por vezes, para sem saber porquê.
Matemático em face um teorema
Onde falta não sabe bem o quê?

Assim, todos os dias, no começo,
Não sei o que escrever, nem o que sinto.
E pago no soneto o estranho preço
A falta de um talento há muito extinto.

Qual navegante vou por estes mares,
Com medo do gigante Adamastor.
Apenas quando lanças teus olhares
Desfaz-se todo o medo em Teu amor.

Navego então em águas sem escolhos
De cor verde marrom entre teus olhos.


Jaguariúna, 15/02/2010.
Ives Gandra

SONHAR

SONHAR

Quantos sonhos já tive em minha vida?
Quantas vezes vivi-os sem saber?
A distância não faz ser esquecida
A imagem que penetra este meu ser.

Pensei já ter vivido no passado,
Empunhando as espadas medievais,
Cavalgando um cavalo já selado
Com armas e brazões de samurais.

Na luta descobria a descoberta,
Que se descobre atrás do próprio sonho.
Um sonho que refaz a senda incerto
Nos versos em que os dias eu reponho.

Eu sonho, muitas vezes, todo o dia
Num sonho que meu verso não recria.



Jaguariúna, 14/02/2010.
Ives Gandra

SER PERFEITO

SER PERFEITO

Os dias, por mais longos, são mais curtos,
O tempo passa, corre sem parar.
De saudades, às vezes, tenho surtos
Quais as águas nos ventos sobre o mar.

Deus conhece meus erros, meus acertos,
Os acertos a Deus eu devo tudo
E espero, no perdão, os seus consertos,
Falando no silêncio, verbo mudo.

Enquanto tiver forças lutarei.
Preparando-me assim a ser chamado
Quando bem o quiser o Eterno Rei,
Que um dia descobri junto a meu lado.

O perdão pedirei por todo o feito,
E verei para sempre o Ser perfeito.


SP, 07/02/2010.
Ives Gandra

A ARMA DA PALAVRA

A ARMA DA PALAVRA

Na agenda Mar Azul de meus sonetos,
O mês de fevereiro tem Camões.
Marluce que a me deu p’ros meus quartetos
Pôs os versos “das armas e os barões”.

Falou de seus heróis em português,
Aquele que é supremo a todos vates.
Não teria, porém em nossa terra,
Políticos heróis para combates.

O mar azul coberto, em negridão,
Espelha dos governos a falência,
Tristes costumes são a podridão
Que exala do poder em pestilência.

Já velho, contra o mal qu’ora se lavra,
Apenas tenho a força da palavra.


SP, 06/02/2010.
Ives Gandra

A CAMINHO DA TIRANIA

A CAMINHO DA TIRANIA

Celeremente a nação triste caminha
Par’uma ditadura socialista.
Lula e seus companheiros são a linha
De quem da tirania tem a pista.

Já deixou o direito para o lado,
Seus projetos são contra a Lei Suprema,
Para todos manda o seu recado,
Que sempre se reduz a monotema.

Aparelha o governo com os seus,
Nossos tributos gasta, inutilmente.
Há muito em que se julga o próprio Deus,
Num patamar de glória diferente.

Neste ano eleitoral faz o que quer
Pensando em eleger uma mulher.


SP, 01/02/2010.
Ives Gandra

O PREÇO D’ALMA

O PREÇO D’ALMA

Atípico este mês. Último dia.
Um domingo chuvoso como todos.
Minha luta transforma-se em porfia
Como as águas tiradas pelos rodos.

Voltam sempre por mais que são tiradas,
O que importa, porém, é não parar.
Na vida, caminhamos por estradas,
Que podem descobrir o imenso mar.

As dores, os fracassos ou sucessos
No pouco tempo nosso, pouco são.
Se soubermos vencer nossos regressos,
Manteremos saudável, o coração.

Quem fica acima de qualquer tropeço,
Su’ alma para Deus já não tem preço.

SP, 31/01/2010.
Ives Gandra

TEMPO FINITO

TEMPO FINIT.

O tempo se desfaz todos os dias.
Começa de manhã e morre à noite.
Ninguém recebe cartas de alforrias,
Nem qualquer vida passa sem açoite.

Pensamos ser eterno o transitório,
E transitório o que se faz eterno.
Está-se em permanente suspensório,
Sem perceber-se que é chegado o inverno.

A Deus que nos criou nem sempre Vamos,
Embora nossos atos julgará,
Um domingo vivemos só de ramos,
Depois vemos a cruz que O pregará.

Na existência forjada no seu rito,
Nosso tempo se faz tempo finito.


SP, 28/01/2010.
Ives Gandra

TRIBUTOS E MORTES

TRIBUTOS E MORTES.

Questão de imunidade uma vez mais,
Enfrento em parecer a elaborar.
Quando um governo gasta por demais,
Não tem p’ra quem faz bem nenhum olhar.

Há muito que o governo pouco faz,
Para os que necessitam ter amor
Saúde, educação, tudo isto jaz,
Só se salva o terceiro bom setor.

O povo do poder está cansado,
Eleitorais, consistem as promessas
Jamais cumpridas. Postas só de lado.
As tristezas no rosto são impressas.

As despesas inúteis não têm cortes,
Mas temos os tributos, temos mortes.


SP, 26/01/2010.
Ives Gandra

PLANO E PODER

PLANO E PODER.

Com todos meus amigos quando falo
Do plano de direitos desumanos,
Sem exceção, desejam pelo ralo
Do esquecimento pô-lo por uns anos.

O plano não é ruim, é um plano péssimo,
Imposto sem debate aos brasileiros.
Dele não se salva nem um décimo,
Pois um plano repleto de vespeiros.

Um golpe representa, à luz do dia,
Aos valores supremos da Lei Prima.
Atinge, por ser vil, democracia,
Afastando do ser qualquer estima.

Um grupo, sem ter voto, quer poder
E não soltá-lo mais até morrer.

SP, 22/01/2010.

Ives Gandra

A VERDADEIRA RIQUEZA

A VERDADEIRA RIQUEZA


O tempo passa, mas a vida fica,
Mesmo que a morte a leve no seu tempo,
Vale uma vida pela luta rica,
Riqueza d’alma que resiste ao vento.

Armazenar detritos pelo mundo,
Malgrado sejam coisas muito finas,
De pouco vale, pois só é fecundo
O bem que para os outros tu destinas.

Vaidade, sensualismo mais poder,
Como os bens materiais findam um dia,
E no momento agudo de morrer,
De pouco servem, já não têm valia.

Quem desejar ter pleno o coração
Só vale o que fizer a seu irmão.

SP, 21/01/2010.
Ives Gandra

APRENDIZES DE DITADORES.

APRENDIZES DE DITADORES.

Entra o Brasil de novo em retrocesso,
Com plano de direitos desumanos,
O meretrício sai de seu recesso
No apoio às prostitutas e aos enganos.

Os guerrilheiros que mataram gente,
Amigos da cubana ditadura,
Nos direitos que buscam, de repente,
Continuam a viver de sinecura.

Discípulos que são da tirania,
Empalmaram poder sem terem votos,
Não desejam jamais democracia,
Do ódio aos que divergem são devotos.

Que meu país rechace os aprendizes,
Que de Chávez recebem diretrizes.


SP, 20/01/2010.
Ives Gandra

HAITI

HAITI


Tremeu a terra no Caribe pobre.
Milhares foram mortos de uma vez.
E muitos morrerão. A pedra encobre
Os corpos quase só de negra tez.

O mundo, consternado, dá-lhe apoio,
Mas a miséria é tanta e o sofrimento,
Que é difícil livrar do trigo o joio,
Quando o povo se põe todo ao relento.

Os mistérios da vida e da tragédia
Quem é que desvendar, na luta, há-de?
Nem se lê na melhor enciclopédia
O que a dor representa de verdade.

Renova-se a tristeza de Jesus
Quando morreu pregado numa cruz!

Jaguariúna, 14/01/2010.

Ives Gandra

O UNIVERSO E O VERSO


O UNIVERSO E O VERSO

O mar azul me faz sempre pensar
E o pensamento faz-me mais discreto.
O mar é nada, mas é sempre mar,
Se comparado ao universo reto.

Meu pensamento vai bem mais distante
Que a distância do cosmos conhecida.
E sempre foi assim, desde eu infante,
Como será assim por toda a vida.

A diferença está pelos bilhões
Dos anos que o universo durará.
Meus pensamentos corre aos borbotões
Mais logo pelo tempo morrerá.

Quanta ironia existe no Universo
Que é maior e menor de que meu verso.

Ives Gandra

sábado, 23 de outubro de 2010

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS


IVES GANDRA DA SILVA MARTINS

Ives Gandra da Silva Martins, renomado jurista brasileiro com reconhecimento internacional, é professor emérito das universidades Mackenzie, Paulista e da ECEME – Escola de Comando do Estado Maior do Exército.

Presidente do Conselho da Academia Internacional de Direito e Economia, é membro das Academias de Letras Jurídicas, Brasileira e Paulista, Internacional de Cultura Portuguesa (Lisboa), Brasileira de Direito Tributário, Paulista de Letras, dentre outras.

Ao longo de sua notável trajetória, recebeu vários prêmios: Colar de Mérito Judiciário dos Tribunais de São Paulo e do Rio de Janeiro, Medalha Anchieta da Câmara Municipal de São Paulo, Medalha do Mérito Cultural Judiciário do Instituto Nacional da Magistratura e da Ordem do Mérito Militar do Exército Brasileiro, apenas para mencionar alguns. Já participou e organizou mais de 500 congressos e simpósios, nacionais e internacionais, sobre direito, economia e política.

O professor Ives Gandra é autor de mais de 40 livros individualmente, 150 em co-autoria e 800 estudos sobre assuntos diversos, como direito, filosofia, história, literatura e música, traduzidos em mais de dez línguas em 17 países.

Acadêmico das: Academia Paulista de Letras, Academia Paulista de Letras Jurídicas, Academia Brasileira de Letras Jurídicas, Academia Internacional de Cultura Portuguesa, Academia Matogossense de Letras, Academia Cristã de Letras, Academia de Letras da Faculdade de Direito da USP.